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Buscando...?

quarta-feira, 30 de março de 2011

espiral

Como disse o Chico:

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu...

A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega o destino prá lá ...

Verdade.
E eu comecei o dia assim.
Meio de saco-cheio de existir.
Saí a cumprir minhas obrigações samsaricas de sempre e alguma coisa diferente: quebrar um galho de um amigo procurando por uma revista que ele não conseguia achar... Achei!
E um outro havia perdido todos os seus documentos na minha cidade dia desses  (madrugada dessas, precisamente falando...) e eu havia prometido ajudá-lo na tentativa de recuperar, já que ele não mora aqui. Me lembrei da promessa.
Resolvi, então, dar uma passada nos Correios, para onde já havíamos telefonado uns dias antes para saber dos documentos sem sucesso, mais por desencargo de consciência por ter prometido e me empenhado aquém do que deveria, e ver se os documentos apareceram por lá... E não é que lá estavam! Quem quer que os tenha encontrado devolveu até que bem arrumados! Logo telefonei para o moleque e deixei ele feliz! Mas o interessante (ou não muito, mais...) é que aquela nuvenzinha preta que sombreava minha calva permitiu a passagem de uns raios de sol bem luminozinhos. Fazer o bem me fez bem, nenhuma novidade nisso. O cara estava bastante chateado, havia perdido todos os documentos, aquela mão de obra para tirar tudo de novo! E eu, muito felizmente, pude começar o dia dele com uma boa notícia! E dar continuidade ao meu condicionando uma melhora de humor considerável. E como a vida, me esforço nisso sempre, é o Buddhadhamma, logo me pus atento ao fato, já observado por aqui em algum post, de eu ser, meramente, este complexo de condições que se movimenta e pensa e age carregando a ilusão de um eu! Surge uma nova condição, cessa outra, e é o que basta para que a ilusão ganhe nova aparência: o eu de saco cheio vira o eu alegrinho e vice-versa! A vida em seus loucos encantos, para ser breve.
E a prática do dhamma, me parece, segue como uma caminhada numa espiral em cujo centro se encontra o Despertar. É para lá que precisamos manter a cabeça voltada enquanto caminhamos... Se assim fazemos, nos mantemos atentos aos marcos que estão no caminho para o centro, e várias vezes os discernimos... Parece que vamos revendo-os a cada vez mais de perto... Não é como viver uma mera repetição de situações, como no caso da roda viva! Ou como caminhar pela espiral do Buddhadhamma com a cabeça voltada para o lado de fora, desatentos ou desinteressados de saber para onde vamos ou o que estamos fazendo. E, até, saltando para um braço mais externo da espiral vez ou outra...
Fazer o bem é bom para quem faz.
O Buddha nos ensina a ir além e transformar o bem alcançado em algo superior: estar bem é uma condição muito preciosa para ser desperdiçada no mero desfrute. Quase tão ruim quanto começar o dia ouvindo e cantando Roda Viva.

***

Eis que anatta é atualização do "Uma Palavra Por Dia - A Pali Word A Day"

segunda-feira, 28 de março de 2011

sabor

é o saber que liberta
nenhuma força, nenhum controle
esforçar-se apenas para permitir
a mente sendo o que é
livre para ser o que é
e cumprir sua função
sem interferência 
sabendo o que é o que
e emergir do saber 
em metta
na satisfação da bondade amorosa
por tudo
no amor de se saber
e saber o resto


sexta-feira, 18 de março de 2011

morte

Tenho estado com a morte há alguns dias.
O início se deu com a narrativa saramaguiana das fabulosas intermitências. Nos entremeios, surgiram um texto do professor Ricardo Sasaki (dhammacharya dhanapala) sobre a concepção buddhista do pós morte e um longo diálogo sobre buddhismo e renascimento com uns materialistas. Isso me manteve no tête-à-tête com a morte por estes dias, com a morte na cabeça... E aí veio o tsunami, num desgraçante arremate a escancarar-me como é que, para a vida e a morte, dois nomes que, bem pode ser, inventamos para um mesmo mistério, não somos em nada diferentes das formigas. Apesar de todos os valores e importâncias que projetamos no mundo, nossos reality shows, minhas HQs, os celulares, os iQualquercoisa, desejos e encomendas que não chegam, nossos relacionamentos e momentos, nada disso nos resolve. Dificilmente vão além do que fazemos ir em conformidade com a nossa reconfortante estupidez: formas de mantermos os olhos fechados para o fato de estarmos morrendo.
Estar de papos com a morte na verdade significa meramente  tentar fazer-se ciente dela que sempre está conosco. 
Como ensinou o Buddha, nestas temporadas é quando mais sinto que dou passos no Caminho. Tomar consciência da presença da morte ocupa a mente com a certeza e coloca a dúvida a meu favor. Aonde eu estou é onde eu devo estar e é onde se dá minha prática. Tudo tem que ser percebido como sempre é, dhamma, se eu habito na consciência do que é inevitável e certo. Meu caminhar passa a ser constante e reto com a meta a minha frente, imediata, pois não sei se há tempo para 'chegar lá'. Minha única incerteza é com respeito a quando o fato se cumprirá. Estar com a morte me mantém atento para a importância de respirar e notar os movimentos do corpo e da mente. Pois qualquer que seja, o fim do movimento é um só. Estar com a morte me mantém atento para a minha igualdade com as formigas, minha desimportância e meu poder.

Speech by ReadSpeaker