esta frase, vai que você, assim como eu, entenda quase nada de pāli, significa que o ensinamento do Buddha deve ser experimentado e realizado por cada um, cada um contínuo processo de mente e corpo. e as palavras, os textos, os amigos e os professores são indispensáveis para a maioria de nós. dito isso, passemos à iconoclastia.
desde que terminei de ler o 'confissões de um ateu budista' eu queria falar da minha iconoclastia congênita, sair do armário, embora sempre tenha deixado pistas por aqui, ui! e o mote final veio no último domingo quando li sobre mais um escândalo sexual envolvendo um respeitado mestre buddhista nos eua. a coisa está triste e feia para ele. não vou dizer quem ou a tradição pois isso é um problema nosso acima de qualquer outra coisa. e penso que o Buddha tenha deixado estratégias capazes de, dentro da Sua disciplina, prevenir tais desvios.
o Buddha foi um mestre religioso que tinha a postura do 'duvide de mim'. o kalama sutta, dos meus preferidos, é o paradigma desta posição. há também uma passagem da qual eu gosto bastante narrada por ajahn chah em que o Buddha pergunta a um dos seus principais discípulos, sāriputta, se este acreditava num ensinamento que havia acabado de receber do mestre, sāriputta disse que não, que precisava por a prova antes, e o Buddha louvou sua atitude.
há outros pontos.
antes de tornar-se Buddha, o jovem andarilho teve ao menos dois mestres aos quais abandonou após concluir que não estavam corretos. e, finalmente uma passagem importante para a minha opinião, quando próximo de Sua morte foi perguntado por ānanda, seu assistente e responsável pela transmissão futura de muitos sermões, quem assumiria Seu lugar como o guia para a comunidade, o Buddha disse que seria o Dhamma, nenhuma pessoa, mas o Dhamma. pode pesquisar.
se precisamos de algo para nos agarrar, muitas vezes o encontramos numa crença, numa fé, numa pessoa. o que o Buddha dizia sobre a fé? que era algo útil desde que sempre posta a prova e alimentada empiricamente. e ninguém desperta ninguém, nem o Buddha. o guia aponta o caminho. só o conhecimento pessoal, direto é o que desperta, e tal conhecimento não é possível se soterrarmos nosso senso crítico, analítico, nosso bom senso sob uma montanha de fé. a fé pode gerar ou alimentar no discípulo o engodo de que um mestre pode fazer o que nem o Buddha fez, e num mestre pode gerar a crença de que ele seja capaz de tamanho milagre. perigoso isso, como atestam os vários casos de abuso por parte de professores buddhistas.
bons amigos, bons professores são necessários. mas os bons e, no caso, bons pelos critérios do Buddhadhamma. um destes critérios eu entendo como 'pode duvidar de mim' e, como comecei lá em cima:, nos cabe o paccattaṃ veditabbo. mas dá trabalho isso. temos que nos esforçar, estudar, desafiar nossas crenças sobre tudo, incluindo nós mesmos, nada tão fácil como crer e confiar cegamente e esperar por uma luz que nos ilumine. mas o que pode surgir disso é uma mão que nos boline.
esta postura tem manifestação em diversos níveis. em listas e grupos de discussão abertos pela rede, e em presenciais da mesma forma, sempre há as pessoas dependentes de crer acima de tudo. tudo que é dito por uma autoridade ou meramente um nome oriental é imediatamente louvado e sorvido com gosto. frases de power point atribuídas ao dalai lama e outros carismáticos mestres, muitas vezes equivocadamente note-se bem, fazem tremendo sucesso. pois bem, foi num grupo virtual deste tipo que um texto foi publicado e saudado como excelente. eu fazia parte do grupo.
aprendi uma metáfora, no buddhismo tibetano, que nunca esqueço: numa tina de água límpida, pingue uma gota de excremento e ofereça para ver se alguém bebe da água, ainda que clara e fresca. no tal texto em questão eu apontei que havia não uma gota, mas uma boa colher de sopa. iniciou-se uma discussão agradável, onde nenhum dos erros que apontei, nenhum dos meus argumentos foi refutado, mas onde se concluiu que o texto era excelente porque foi tal mestre que escreveu, logo só podia ser excelente. e eu, talvez por ser um mero silva, um furtado de sabedorias, estava claramente tomado por impurezas mentais agindo como o arauto da discórdia. ponto final.
sempre procurando estar cônscio da desgraça de ser humano entre humanos, dei de ombros e fui.
pensando em retrospectiva, este me parece ser um exemplo claro, em escala embrionária, da mentalidade que gera os escândalos: a pessoa acima do óbvio, dos registros dos suttas, do bom senso e de qualquer argumento.
incapaz de confiar em qualquer um que diga confie em mim plenamente, em grande parte sou buddhista justamente por isso. e, quando confio, confio agora, amanhã é outro dia.
alguém que afirma conhecer a verdade não deve ver problema em que duvidem dele, como fazia o Buddha. acho que seria bom se muitos buddhistas lembrassem sempre disso, mestres e alunos.
desde que terminei de ler o 'confissões de um ateu budista' eu queria falar da minha iconoclastia congênita, sair do armário, embora sempre tenha deixado pistas por aqui, ui! e o mote final veio no último domingo quando li sobre mais um escândalo sexual envolvendo um respeitado mestre buddhista nos eua. a coisa está triste e feia para ele. não vou dizer quem ou a tradição pois isso é um problema nosso acima de qualquer outra coisa. e penso que o Buddha tenha deixado estratégias capazes de, dentro da Sua disciplina, prevenir tais desvios.
o Buddha foi um mestre religioso que tinha a postura do 'duvide de mim'. o kalama sutta, dos meus preferidos, é o paradigma desta posição. há também uma passagem da qual eu gosto bastante narrada por ajahn chah em que o Buddha pergunta a um dos seus principais discípulos, sāriputta, se este acreditava num ensinamento que havia acabado de receber do mestre, sāriputta disse que não, que precisava por a prova antes, e o Buddha louvou sua atitude.
há outros pontos.
antes de tornar-se Buddha, o jovem andarilho teve ao menos dois mestres aos quais abandonou após concluir que não estavam corretos. e, finalmente uma passagem importante para a minha opinião, quando próximo de Sua morte foi perguntado por ānanda, seu assistente e responsável pela transmissão futura de muitos sermões, quem assumiria Seu lugar como o guia para a comunidade, o Buddha disse que seria o Dhamma, nenhuma pessoa, mas o Dhamma. pode pesquisar.
se precisamos de algo para nos agarrar, muitas vezes o encontramos numa crença, numa fé, numa pessoa. o que o Buddha dizia sobre a fé? que era algo útil desde que sempre posta a prova e alimentada empiricamente. e ninguém desperta ninguém, nem o Buddha. o guia aponta o caminho. só o conhecimento pessoal, direto é o que desperta, e tal conhecimento não é possível se soterrarmos nosso senso crítico, analítico, nosso bom senso sob uma montanha de fé. a fé pode gerar ou alimentar no discípulo o engodo de que um mestre pode fazer o que nem o Buddha fez, e num mestre pode gerar a crença de que ele seja capaz de tamanho milagre. perigoso isso, como atestam os vários casos de abuso por parte de professores buddhistas.
bons amigos, bons professores são necessários. mas os bons e, no caso, bons pelos critérios do Buddhadhamma. um destes critérios eu entendo como 'pode duvidar de mim' e, como comecei lá em cima:, nos cabe o paccattaṃ veditabbo. mas dá trabalho isso. temos que nos esforçar, estudar, desafiar nossas crenças sobre tudo, incluindo nós mesmos, nada tão fácil como crer e confiar cegamente e esperar por uma luz que nos ilumine. mas o que pode surgir disso é uma mão que nos boline.
esta postura tem manifestação em diversos níveis. em listas e grupos de discussão abertos pela rede, e em presenciais da mesma forma, sempre há as pessoas dependentes de crer acima de tudo. tudo que é dito por uma autoridade ou meramente um nome oriental é imediatamente louvado e sorvido com gosto. frases de power point atribuídas ao dalai lama e outros carismáticos mestres, muitas vezes equivocadamente note-se bem, fazem tremendo sucesso. pois bem, foi num grupo virtual deste tipo que um texto foi publicado e saudado como excelente. eu fazia parte do grupo.
aprendi uma metáfora, no buddhismo tibetano, que nunca esqueço: numa tina de água límpida, pingue uma gota de excremento e ofereça para ver se alguém bebe da água, ainda que clara e fresca. no tal texto em questão eu apontei que havia não uma gota, mas uma boa colher de sopa. iniciou-se uma discussão agradável, onde nenhum dos erros que apontei, nenhum dos meus argumentos foi refutado, mas onde se concluiu que o texto era excelente porque foi tal mestre que escreveu, logo só podia ser excelente. e eu, talvez por ser um mero silva, um furtado de sabedorias, estava claramente tomado por impurezas mentais agindo como o arauto da discórdia. ponto final.
sempre procurando estar cônscio da desgraça de ser humano entre humanos, dei de ombros e fui.
pensando em retrospectiva, este me parece ser um exemplo claro, em escala embrionária, da mentalidade que gera os escândalos: a pessoa acima do óbvio, dos registros dos suttas, do bom senso e de qualquer argumento.
incapaz de confiar em qualquer um que diga confie em mim plenamente, em grande parte sou buddhista justamente por isso. e, quando confio, confio agora, amanhã é outro dia.
alguém que afirma conhecer a verdade não deve ver problema em que duvidem dele, como fazia o Buddha. acho que seria bom se muitos buddhistas lembrassem sempre disso, mestres e alunos.
2 comentários:
O que me encanta no Buddhadhamma é justamente o fato de não precisar acreditar nele. Posso me sentar silenciosamente e ver o que acontece.
Além disso, o Tathagata sempre deixava de lado o que não era essencial. O que ultrapassasse 'O sofrimento existe, tem uma causa, pode ser superado, há um caminho para superá-lo' é mero acessório, podendo ser deixado de lado sem dó nem piedade.
Enfim, obrigado por compartilhar seus pensamentos.
eu que agradeço pela visita.
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